quinta-feira, 24 de abril de 2008

O uso da propaganda eleitoral em face do princípio da impessoalidade na Administração Pública.

Vinícius Bezerra- Estudante de Direito da UNEB


Introdução:


A lei n° 9504 de trinta de setembro de 1997, que foi parcialmente alterada pela lei 11300 de dez de maio de 2006, dispõe sobre a legislação eleitoral no ordenamento jurídico brasileiro, regularizando, entre outras coisas, a propaganda eleitoral.
Nesse propósito o princípio da impessoalidade, como corolário do princípio da legalidade, norteia o administrador público no sentido de proibir o personalismo na ordem pública, atuando com objetividade e neutralidade em detrimento da promoção pessoal do agente público.
Por meio deste trabalho busca-se evidenciar as regras atinentes à vedação da promoção pessoal e da propaganda eleitoral a partir do desvelamento do princípio da impessoalidade.
Este trabalho implica numa análise doutrinária do princípio supracitado, positivado na constituição federal e em legislação infraconstitucional, bem como sua relação com os princípios da moralidade, finalidade e legalidade. Adentrando nas leis que regulam a propaganda do agente executivo da administração pública, que atuam exclusivamente como o escopo de se auto propagandear com vistas a eleições que se aproximam, na problemática de que executivo não pode promover o governo ou algumas de suas autoridades.
Ademais, indicam-se as ações processuais no sentido de fulminar essa prática de há muito tempo existente do ordenamento jurídico brasileiro, através de ação civil pública e ação popular.

°. Dos princípios que delimitam a atuação da administração pública.

Os princípios sempre representaram um feixe de valores pelo qual os juristas interpretam o direito. A atual doutrina entende que os princípios estenderam-se de meros instrumentos de que se utilizavam os operadores do direito de interpretação e aplicação do direito e assumiram um caráter normativo, similar às regras positivadas, isso significa que a sua observância é obrigatória, pois, a contrario senso, a sua não-observância representa a invalidez de um ato.
Nesse sentido, os princípios que norteiam a administração pública estão elencados na Constituição em seu art., caput:
“A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência” [i]

° Princípio da impessoalidade


Decorre do princípio da publicidade que todos os atos administrativos devem ser divulgados, no sentido de informar a população e dar início a os seus efeitos externos.
Acontece que a prática de atos do poder público visando promover o governo é corrente no Brasil e no mundo. Montesquieu já dizia “que aquele que detém o poder tende a abusar”.
Com o intuito de proibir a prática de personalismos, a constituição federal positivou o princípio da impessoalidade em seu art. 37, caput.
É necessário dizer que a doutrina divide esse princípio em duas posições. Uma em relação ao administrador e outra em relação ao administrado. Esta última é o que José Cretella Júnior nomeia de princípio da igualdade dos administrados, que significa que “a administração pública não pode estabelecer privilégio de tratamento entre os administrados”.[ii]
Em outra abordagem, a qual analisa este trabalho, é em relação à figura do administrador. Vale mencionar a indefinição na doutrina nesse sentido. Para o mestre Hely Lopes Meirelles o principio se refere ao da finalidade, para o qual o agente deve fundar seus atos em busca do fim que a lei determina, agindo de forma impessoal, [iii]
Já parte da doutrina, referendada pelo professor Celso Antônio Bandeira De Mello entende que o principio nada mais é que uma dedução do princípio da legalidade, para o qual o Estado não deve se confundir como a pessoa do administrador.[iv]
Sem embargo dessas distinções é correto dizer que o princípio da impessoalidade revela-se na finalidade de atuação administrativa, não podendo esta agir em benefício de interesses particulares. A conduta do agente público deve-se pautar sempre na objetividade e imparcialidade, tendo como único propósito a supremacia do interesse público.
Logo, é vedada à administração pública a vinculação dos seus atos a pessoa do executivo. Tanto o é assim, que, a Carta Política reserva em seu art. 37,§ 6 que as pessoas jurídicas de direito público responderão pelos danos que seus agentes causarem a terceiros, configurando a responsabilidade objetiva do Estado, isto é, a administração pública é que é a responsável civilmente e não os seus servidores.
Em síntese, vale mencionar o pensamento do ilustre José Afonso da Silva, para quem o a impessoalidade significa que:

“os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao funcionário que os pratica mas ao órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o funcionário. Este é um mero agente da administração pública, de sorte que não é ele o agente institucional do ato. Ele é apenas o órgão que formalmente manifesta a vontade estatal”.[v]

A conseqüência direta do dispositivo é que a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos não poderão constar nomes, símbolos, imagens, slogans, que caracterizem, de alguma forma, promoção pessoal de algum órgão público ou do seu executivo.


Questões pertinentes à propaganda eleitoral:


Fazem-se mister algumas considerações sobre o pleito. Este se revela na disputa de votos pelos candidatos do eleitorado. Divide-se em duas fases: A primeira inicia-se com a escolha do candidato em convenção partidária. Em seguida, segue-se o pedido de registro que é solicitado à instância competente da Justiça Eleitoral, isto é, TSE, TRE ou juiz da Junta Eleitoral. Deferido o pedido de registro, inicia-se a segunda fase com a campanha eleitoral passando pela votação, apuração, proclamação dos eleitos e, por fim, a diplomação.
Nessa segunda fase, a propaganda eleitoral se inicial. Esta significa o período caracterizado pelos três meses anteriores à eleição, começando no dia cinco de julho. Esta significa toda e qualquer demonstração, explícita ou implícita, que leva o eleitorado a concluir que o agente é o mais competente para exercer a função pública.
Nesse período, não pode o agente público ceder em benefício de qualquer candidato, o que inclui a sua própria pessoa, bens movéis e imóveis, materiais e serviços, pertencentes à administração direta ou indireta, bem como fazer ou permitir uso de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público.
Por vezes a divulgação de campanha pode ter a pretensão de ser institucional, vale dizer, possuir caráter educativo, informativo ou de educação. Porém, por falta de qualquer um desses elementos o agente público acaba praticando ato de mera promoção pessoal com o escopo de divulgar campanha eleitoral. Consequentemente o servidor fere o princípio da impessoalidade.
Fora desse período fixado por lei, a propaganda eleitoral é proibida e gera sanção de
multa, por constituir propaganda extemporânea, violando o artigo. Para aclarar:

“(...) Propaganda eleitoral extemporânea. Multa. Art. 36, § 3o, da Lei no 9.504/97. Cartas enviadas pelo secretário da Educação a alunos da rede pública de ensino contendo convocação e instruções para a matrícula. Menção do nome do governador com referências elogiosas a seu interesse e preocupação com a educação. Alegação de ausência de comprovação do prévio conhecimento do beneficiário não prequestionada. Configuração de propaganda irregular porque assentado que para atingir o fim colimado não seria imprescindível mencionar o nome do agravante. (...)” (Ac. no 1.225, de 15.4.99, rel. Min. Eduardo Alckmin.) [vi]

Cumpre salientar que nos três meses que antecedem o pleito, pelo Art. 77 da lei n° 9504 é proibido aos candidatos a cargos do Poder Executivo participar, nos três meses que precedem o pleito, de inaugurações de obras públicas.
Do mesmo modo que nos três meses que antecederem as eleições, na realização de inaugurações é vedada a contratação de shows artísticos pagos com recursos públicos.
Além disso, é vedada a veiculação de propaganda eleitoral em bens cujo uso dependa de cessão ou permissão em bens públicos em bens de uso comum, vale dizer, “constitui crime, punível com detenção, de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de dez mil a vinte mil UFIR.” (art. 37 9504)

Propaganda Eleitoral e Mera Promoção Pessoal:


Cumpre dizer que a propaganda eleitoral é diferente da mera promoção pessoal. Nessa mesma linha de entendimento segue a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A primeira não deve estar relacionada ao cargo que pretende concorrer o candidato, enquanto que a segunda se relaciona apenas com o nome do mesmo, em demasia. Nas precisas palavras da ministra Ellen Gracie “A propaganda, dependendo do local em que é colocada, pode restar configurado abuso de poder.”[vii] .Segue jurisprudência do TSE:
“Consulta. Diferença entre propaganda eleitoral e promoção pessoal. 1. A colocação de cartazes em táxis ou ônibus (busdoors) divulgando lançamento de livro, programa de rádio ou televisão, apenas com a foto do candidato, sem conotação eleitoral, configura mera promoção pessoal, destacando-se que o excesso pode configurar abuso de poder. A menção ao cargo que ocupa, o qual em nada está relacionado aos produtos objeto da publicidade, configura propaganda eleitoral. 2. Mensagens festivas contendo apenas o nome do candidato, sem conotação eleitoral, não configuram propaganda eleitoral. Precedentes.”(Res. no 21.104, de 23.5.2002, rel. Min. Ellen Gracie.) [viii]



O juiz natural da propaganda eleitoral é a Justiça Eleitoral , ou seja, esta é competente para conhecer e julgar de matéria relativa à propaganda eleitoral.
Porém a Justiça Eleitoral é incompetente para examinar ofensa ao princípio da impessoalidade na propaganda meramente institucional, isto é, que não tenha intuito eleitoral, pois nesse caso trata-se de infração de natureza administrativa. A competência é da Justiça Comum.


°O Que Fazer: Ação Civil Pública e Ação Popular


A infração ao princípio da impessoalidade constitui abuso de autoridade. Consequentemente cabe ação civil pública ou ação popular
Existindo indício de uso da máquina administrativa para beneficiar candidatos como o intuito de influir nas eleições cabe ação civil pública
Nesse sentido, coloca o art. 22 da Lei Complementar no 64/90 que:

“qualquer candidato, qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político (...)”

A ação popular visa à preservação dos postulados da administração pública. Viabiliza-se pela ilegalidade ou ilegitimidade de um ato lesivo comissivo ou omissivo da administração pública.

°Conclusão:


Não com o intuito de rematar o tema, mas sim de fornecer uma compreensão mais abrangente do assunto, amplificando o debate de forma a delimitar o âmbito da propaganda eleitoral em face do princípio da impessoalidade.
Fica claro que a intenção do legislador constituinte, através do art. 37,§1 da constituição Federal, é proibir pessoalidade e a publicidade do administrador público, cuja atuação deve pautar-se sempre na objetividade e neutralidade.Os reflexos na legislação eleitoral se refletem na lei n°9504/97, no sentido de regularizar a mensagem publicitária. Deduz-se então que a máquina administrativa não deve se utilizar dos seus recursos, muito menos da propaganda institucional para beneficiar um candidato ou partido às eleições que se aproximam. Com isso, reduzem-se os gastos governamentais como campanhas publicitár

[i]
[ii]
[iii]
[iv]
[v]
[vi] Disponível em http://www.tse.gov.br/servicos_online/catalogo_publicacoes/jurisprudencia_eletronica/livros/propagandaeleitoral/28propaganda_institucional.htm
[vii]
[viii] http://www.tse.gov.br/servicos_online/catalogo_publicacoes/jurisprudencia_eletronica/livros/propagandaeleitoral/24promocao.htm

http://www.paranaeleitoral.gov.br/artigo_impresso.php?cod_texto=104